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Memórias secretas da princesa do Brasil: as quatro coroas de Carlota Joaquina



(tradução revista)

De José Presas
Prefácio de Laura de Mello e Souza
Tradução de R. Magalhães Jr.
ISBN 978-85-60584-01-7
248 pp. R$ 36,00

Nascida infanta de Espanha e princesa do Brasil por seu casamento com o príncipe herdeiro d. João, não bastou a Carlota Joaquina a certeza de se tornar um dia rainha de Portugal. Enquanto esteve exilada no Rio de Janeiro, ela reivindicou o trono espanhol de seu irmão Fernando VII, preso por Napoleão, e também uma inexistente coroa platina, que englobaria os territórios espanhóis na América. Estas Memórias Secretas, escritas por seu vingativo secretário, contam, a partir de um ponto de observação privilegiado e em estilo único, as intrigas políticas da princesa, sem deixar de aludir a outros episódios acarretados por um caráter explosivo e irriquieto. Depois do fracasso de seus projetos, e após a independência do Brasil, Carlota nem por isso deixou de arvorar o título de imperatriz.

Imperatriz do Brasil, rainha de Portugal, rainha de Espanha e rainha do Prata, eis as quatro coroas de Carlota Joaquina. Fazendo valer a altíssima dignidade de sua linhagem, ela tentou como poucas se impor politicamente em uma época na qual cada vez menos se esperava que uma mulher, por mais nobre que fosse, se metesse a governar.

Distribuição própria.
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Saiu na imprensa:

Estadão. Caderno 2 Domingo, 17/05/2009

Os segredos que o tempo revela
Memórias Secretas da Princesa do Brasil é fonte fundamental para entender a polêmica Carlota Joaquina
por Lilia Moritz Schwarcz
Alguns livros podem, e devem, ser lidos de trás para frente - ao revés -, e Memórias Secretas da Princesa do Brasil, de José Presas, é exemplo gritante dessa prática pouco usual. Escrito em 1830 pelo ex-secretário particular de Carlota Joaquina, que diz ter "trabalhado diariamente ao lado da princesa por quase quatro anos", de 1808 a 1812, a obra não passa do relato de um ressentido que, diante do não recebimento do salário (cuja conta apresenta em detalhes), resolve narrar intrigas palacianas, as quais teria presenciado em lugar e momento privilegiados: no contexto em que a Corte portuguesa andava estacionada no Brasil, fugida de Napoleão Bonaparte.

Se o documento tivesse restado perdido, e entregue à sua real dimensão, não haveria motivo para festejar a nova publicação, até agora considerada muito rara no Brasil. O problema é que o livro foi reproduzido inúmeras vezes, e transformou-se - nesse lento movimento do "quem conta um conto aumenta um ponto" - na fonte fundamental para entender essa personagem polêmica chamada Carlota Joaquina, bem como o movimento do Carlotismo - que levou a princesa a lutar, no Brasil, pelo trono da Espanha e das colônias espanholas na América, e a imiscuir-se em todo tipo de manobra política.

Conforme escreve Presas no prefácio da obra: "Se não é coisa nova, tampouco é inútil ou desagradável apresentar ao público os acontecimentos do passado... a liberdade é a alma da história." De fato, o secretário contrariado esmera-se em desenhar o perfil controverso de Carlota; aquele que ficaria guardado na memória oficial. Sem travas fáceis, nosso relator encontraria na princesa personagem das mais indicadas: comenta seus gastos excessivos - a mala de sapatos e o consumo elevado de joias; ironiza o apetite sexual da dirigente, que encontrou saindo de seus aposentos "com o semblante risonho e aceso, como quem acaba de dançar ou fazer outro tipo de exercício violento"; o hábito inveterado de falar mal do esposo d. João; os amigos "efeminados"; ou as expressões vulgares que "ofenderiam a moral e a decência se aqui fossem repetidos".

Mas José Presas, um aventureiro espanhol que chegou ao Brasil apenas a tempo de se safar de uma confusão em Buenos Aires, tinha e não tinha razão nas suas descrições ferinas. De um lado, elas não seriam tão secretas assim, uma vez que, como mostra Laura de Mello e Souza em excelente introdução, no texto descrevem-se mais urdiduras diplomáticas do que intimidades compartilhadas. Além do mais, se Carlota possuía temperamento dos mais intempestivos - e os bilhetes reproduzidos servem como prova -, era também a pessoa errada no lugar certo e vice-versa. Num tempo em que mulheres não faziam política, ela foi antes de tudo uma ativista; em meio à Corte portuguesa, na qual adentrou por laços de casamento, nunca deixou de pensar e se sentir como espanhola.

O contexto também não poderia ser mais apimentado. Os Bourbons espanhóis haviam feito uma política em tudo enganosa e, a despeito de terem se unido aos franceses, facilitando inclusive a invasão de Portugal, acabaram caindo na armadilha de Bonaparte: perderam a coroa em junho de 1808. Carlota, portanto, mal havia chegado ao Brasil quando passou a arquitetar uma maneira de, no impedimento do pai e do irmão, ocupar o trono; já que estava ao abrigo do conturbado ambiente europeu.

A princesa era obstinada, intrigante, mas também inteligente e instruída, ainda mais quando comparada à média da intelectualidade local. Quem sabe Carlota mirasse o exemplo de outras reinantes; sobretudo Isabel de Castela, o grande modelo para qualquer uma que pretendesse tomar as rédeas de Governo. Presas não era, entretanto, homem afeito a esse tipo de novidade. Ao contrário, em nome de rever seu dinheiro amargamente merecido ("nada de dormir, dizia ela, só trabalhar e andar para a frente"), transforma seu depoimento numa sucessão de lamúrias, e jamais perde a oportunidade de avacalhar as pretensões da princesa: "Se para governar não fosse necessário falar, talvez as mulheres governassem melhor que os homens."

Não obstante, nesse tempo dado a contradições de toda ordem, parecia difícil manter lealdades a uma bandeira só. Carlota e seu secretário eram, ambos, representantes de dois ou muitos mundos, e por isso oscilaram aos sabores dos ventos, temperados por nações poderosas como França e Inglaterra. Carlota tentaria tornar-se dirigente, ao menos das colônias espanholas na América, mas em vez do sucesso ganharia o isolamento: foi detestada pelos ingleses, colocada de escanteio por d. João (sempre temeroso de seus golpes) e transformada num espécie de rainha má, a madrasta dos brasileiros, descrita a partir de seus costumes descontrolados, seu caráter brigão e sua aparência por demais masculinizada.

O panfleto seria publicado, porém, tarde demais: apenas em inícios de 1830, quando a rainha viúva entregava a alma ao Criador. Endividada, ela morreria sem experimentar o dissabor de ler as duras palavras de Presas. O ex-secretário não seria ressarcido, mas talvez se sentiria vingado se tivesse conhecimento da difusão que a obra recebeu: não há livro de história do Brasil, da Espanha ou de Portugal que não se remeta ao documento na hora de caracterizar a "voluntariosa" princesa que, mesmo sem querer, ficou atada à trama da história de seu intrigante. Afirmava ele que de nada adiantava rogar a Deus, dotar conventos e igrejas ou encher de donativos frades folgazões. Carlota seria mesmo vítima da máxima de Racine, devidamente evocada por nosso insistente secretário nas conclusões de seu livro: "Não há segredo que o tempo não revele."

Lilia Moritz Schwarcz, professora do Departamento de Antropologia da USP, é autora, entre outros, de O Sol do Brasil (Companhia das Letras)


Folha de S. Paulo / Ilustrada 17/01/2009

NÃO-FICÇÃO
História
Memórias Secretas da Princesa do Brasil
JOSÉ PRESAS
Editora: Phoebus; Tradução: Raimundo de Magalhães Jr.; Prefácio: Laura de Mello e Souza; Quanto: R$ 36 (247 págs.)
SOBRE O AUTOR: Espanhol da Catalunha, secretário e homem de confiança de Carlota Joaquina, testemunhou os acontecimentos que transformaram o Brasil entre 1808, quando a família real portuguesa chegou ao país, e 1812.
TEMA: As intrigas políticas de Carlota Joaquina, princesa do Brasil, casada com d. João, e que reivindica, entre outras coisas, o trono espanhol de seu irmão, Fernando 7º.
POR QUE LER: Publicado originalmente em espanhol, em 1830, este livro sobre o episódio histórico conhecido como Carlotismo teve sua primeira tradução em português em 1940. Não era reeditado no Brasil desde 1966.

Nas malhas da consciência: Igreja e Inquisição no Brasil


de Bruno Feitler
Co-edição Phoebus/ Alameda 2007
292 pp. R$ 38,00
ISBN 978-85-98325-47-7

Este é um livro que se destaca, em nossa historiografia, pela sua originalidade. Originalidade temática, documental e, sobretudo, na concepção do objeto. Pois se é verdade que as pesquisas sobre a história inquisitorial no Brasil cresceram muito nas últimas décadas, em número e qualidade, poucos têm focalizado os aspectos propriamente institucionais e políticos da ação inquisitorial.
De modo geral, têm prevalecido estudos sobre os hereges perseguidos pela Inquisição, em especial sobre os cristãos-novos, sempre suspeitos de judaizar, mas também sobre as feiticeiras, sodomitas, solicitantes, fornicários, blasfemos. Uma plêiade de desviantes, cujas heresias eram temperados pelas mesclas culturais típicas do “viver em colônias”.
A abordagem de Feitler é diferente. Desloca o foco para a própria máquina inquisitorial, priorizando Pernambuco como cenário. O livro expõe, em detalhe, os instrumentos de atuação do Santo Ofício na capitania desde o século XVI ao XVIII, o que permite ao leitor acompanhar o crescente adensamento deste sistema de vigilância das consciências. Apresenta, igualmente, a formação dos quadros, a rede de familiares e comissários que tornou possível a ação do Santo Ofício em terra tão avessa à ortodoxia católica. Desvenda a estreita conexão entre ação inquisitorial e justiça eclesiástica, sublinhando o papel decisivo do episcopado no rastreamento das heresias.
O leitor que presume ter a ação inquisitorial em Pernambuco se limitado à visitação quinhentista, vai se deparar com um sistema muito mais complexo, quer do ponto de vista jurídico-administrativo, quer do ponto de vista político.
Trata-se de um livro de história institucional que, no entanto, se desdobra em historia social e política. Basta citar, como exemplo, o enfrentamento da questão sobre o não estabelecimento, no Brasil, de um tribunal do Santo Ofício, embora a máquina montada na colônia tenha dado conta do recado.
Bruno Feitler nos mostra como e por que isto se deu, ancorado em farta pesquisa arquivística e bibliografia impecável. De modo que este livro cumpre o que mais se pode desejar de uma pesquisa histórica. Ele traz muitas novidades, e o faz com consistência, erudição e elegância.

Ronaldo Vainfas
Professor Titular de História Moderna
Universidade Federal Fluminense

Distribuição das Malhas da Consciência: www.alamedaeditorial.com.br
À venda nas livrarias